E repentinamente Dora decidiu, cheia de alegria e cor, mostrar-se. Fugiu de casa, enlouquecida, primitiva, espírito de aventura, insondável, arriscou, não pediu licença para aparecer. Tudo que uma mulher não costumava ser, tudo que ela não podia ser. Perdeu a "vergonha".
Ela decidiu mudar sua vida de "perfeita rainha do lar". Sobre todas que tomaram a decisão de mudar de vida pairou uma desconfiança de falta de vergonha na "cara". Porque as "honestas", as que denominavam-se "direitas", tinham vergonha. Tinham vergonha de ser mulher, na verdade, ninguém nunca compreendeu ao certo por quê.
Dora ocultava as reações do corpo e o próprio corpo, até os mais evidentes desejos, ocultava até o que pensava, sentia apenas o que lhe era permitido. Se estava satisfeita ou insatisfeita, quem ligava? Importava ser "direita", ter vergonha, ser recatada conhecendo o seu lugar.
Imaginem se, de uma hora para outra, deixando os bloqueios de lado, as mulheres decidissem falar o que pensavam, o que desejavam da vida, o que setiam? Não exatamente confessando para as melhores amigas ou nos diários trancafiados, mas escandalosa e abertamente?
Inicio agora uma série de textos refazendo o caminho daquelas que foram quebrando o silêncio sobre o feminino e reinventando a coragem de ser mulher.